Viagens Estelares
A velocidade da luz é o limite
À noite, quando acendemos a luz de um quarto, temos a impressão de que essa luz chega instantaneamente em todos os pontos do quarto e à nossa vista. Isso porque a velocidade da luz é muito grande (300.000 km/s). A luz gasta frações de décimos de milionésimos de segundo para sair da lâmpada, refletir na parede e chegar às nossas vistas. A sua velocidade é tão grande que, para percorrer os 150 milhões de quilômetros que separam a Terra do Sol, a luz gasta apenas 8 minutos; 4,2 anos para percorrer os quase 40 trilhões de quilômetros que nos separam de Próxima Centauro, a estrela mais próxima do Sol, e 100 mil anos para atravessar a nossa galáxia de ponta a ponta.
A teoria de Einstein
O mais comum, quando alguém ouve falar da Teoria da Relatividade de Einstein, é dizer que ela foge ao bom senso. O fato é que as “novidades” dessa teoria só são perceptíveis quando temos corpos com velocidades muito altas, comparadas com a velocidade da luz, o que, portanto, não faz parte do nosso dia a dia. Segundo Einstein, à medida que a velocidade de um objeto aumenta, sua massa aumenta, seu comprimento diminui e intervalos de tempo medidos por observadores nesse objeto aumentam. Se um corpo qualquer, por menor que fosse, atingisse a velocidade da luz, ele passaria a ter uma massa infinita. Temos assim que toda a energia do universo não seria suficiente para acelerar uma pulga à velocidade da luz. A velocidade da luz é uma velocidade limite, inatingível no universo.
O ano-luz
Uma unidade de distância muito útil em Astronomia e que tem um sentido físico muito interessante, chama-se ano-luz, que é a distância que a luz percorre em um ano e equivale a quase 10 trilhões de quilômetros. Quanto mais distante observamos um objeto, mais no passado estamos vendo-o, devido ao tempo que a luz gasta para sair do objeto e chegar até nós. Quando observamos o Sol, estamos vendo, na realidade, o Sol de oito minutos ou 0,000.016 anos atrás. Quando observamos Próxima Centauro, estamos vendo essa estrela há 4,2 anos atrás. Quando observamos um objeto que se encontra distante 10 anos-luz de nós, estamos vendo-o há 10 anos atrás. O diâmetro de nossa galáxia é de 100 mil anos-luz e estamos há 30 mil anos-luz de seu centro.
Viagens espaciais
Até hoje o homem só saiu da Terra para dar pequenas voltas em seu “quintal”. O objeto mais distante ao qual o homem já chegou foi nosso satélite Lua, embora já consiga enviar, com sucesso, naves não tripuladas a outros planetas do sistema solar. Pela tecnologia atual, mandar uma nave a Próxima Centauro, a vizinha imediata do Sol, nem pensar! Mesmo se conseguíssemos vencer o problema da grande quantidade de combustível necessária, essa nave gastaria centenas de anos para percorrer os 4,2 anos-luz que nos separam dessa estrela. Viagens a velocidades bem mais altas, desde que menores que a velocidade da luz, são, entretanto, permitidas pela Física e, quem sabe, um dia desenvolveremos tecnologia com a qual poderemos mandar naves a outras estrelas. O problema é que a quantidade de combustível necessária para acelerar uma nave cresce vertiginosamente com o aumento da velocidade requerida. À medida que a velocidade da nave cresce, gastamos cada vez mais combustível para acelerá-la cada vez menos. Um combustível do futuro, devido à sua alta eficiência, talvez venha a ser o hidrogênio, que libera energia ao ser transformado em átomos de hélio no processo de fusão nuclear. Uma nave espacial, cujos motores funcionassem a hidrogênio, só para ser acelerada à metade da velocidade da luz, teria que ter mais de 80 vezes a sua massa em combustível. Uma nave viajando à metade da velocidade da luz gastaria 120 mil anos só para ir e voltar ao centro de nossa galáxia.
Ficção e Ciência
Filmes de ficção científica não pretendem ensinar ciência, mas têm influenciado muitas gerações a optarem pela carreira científica. Isto é confirmado, agora, através de pesquisas realizadas em várias universidades, que apontam a influência da série “Jornada nas Estrelas” (“StarTrek” – há mais de 30 anos na televisão e nove filmes no cinema), na carreira dos estudantes. Navegando nessa onda, muitas escolas passaram a usar vídeos de ficção científica como ferramenta no ensino da ciência. A revista “Scientific American”, edição de janeiro último, mostra o resultado de uma pesquisa da “Pardue University”, indicando que os estudantes da universidade consideraram que os filmes de “Star Trek” foram decisivos para promover o interesse deles pela ciência; traz também Terence W. Cavanaugh, um pesquisador de métodos de ensino da Flórida, mostrando como os vídeos da série “Jornada nas Estrelas” provaram ser superiores aos filmes tradicionais de educação como meio de ensinar ciência. Na busca de formas alternativas de ensino, alguns setores da UFMG estão incluindo essa proposta em suas aulas. No Departamento de Física, por exemplo, o grupo de Astronomia do Observatório Astronômico da UFMG, na Serra da Piedade (OAP), pretende incrementar o trabalho de ensino e extensão que se faz ali todos os primeiros sábados do mês e o atendimento a escolas de ensino fundamental e médio com filmes de ficção científica e comentários da parte científica. Isso, após constatarem que boa parte dos freqüentadores do OAP teve seu interesse pelos assuntos científicos despertado pelos filmes de ficção científica.
Driblando a Ciência
Alguns filmes de ficção científica criam mecanismos fantasiosos, cuja aplicabilidade a ciência dificilmente admitiria. Pode-se dizer que não chegam a comprometer a sua utilidade como ferramenta de ensino, desde que a sua apresentação seja acompanhada por profissionais capazes de indicar o que a ciência admite como possível e o que é apenas ficção. É o que pensa o professor de Astronomia do Departamento de Física/ICEx-UFMG, Renato Las Casas. No curso de Astronomia Geral dado este semestre para estudantes de licenciatura em Física, ele orientou o estudante Bruno Moreira de Aguiar, 21 anos, no trabalho “A Física de Jornada nas Estrelas”, a ser apresentado sábado próximo, na programação aberta ao público no OAP da Serra da Piedade. “Sabemos que viagens interestelares como aquelas realizadas pela nave Enterprise em “Jornada nas Estrelas” não podem ser realizadas só com o conhecimento físico de hoje, devido às grandes distâncias entre as estrelas e à impossibilidade de uma nave atingir velocidades iguais ou maiores que a velocidade da luz”, explica o professor, salientando que, para contornar essa situação, criaram-se, entre outras, as idéias de “buraco de minhoca ou túneis no espaço” e “dobra espacial”.
A Ficção vai além
Supondo-se dois pontos nas extremidades de uma folha de papel de 20 centímetros de comprimento, uma formiga, para ir de um ponto a outro, obrigatoriamente teria que percorrer esses 20 centímetros. Se você dobra essa folha e coloca esses pontos próximos um do outro, essa formiga,ainda assim, porque só pode se movimentar no espaço bidimensional que é a folha de papel, teria que andar os 20 centímetros. Mas um mosquitinho, que é capaz de se mover no espaço tridimensional (voando), poderia ir do ponto A ao ponto B, movimentando-se apenas alguns milímetros. “A isso é dado o nome de buraco de minhoca na ficção científica”, diz o professor Renato Las Casas, lembrando que, para termos o equivalente para o espaço tridimensional precisaríamos de uma quarta dimensão espacial, o que é conjecturado quando se discute a possibilidade de túneis no espaço, até hoje não comprovado. Outra solução que permitiria à Enterprise de “Jornada nas Estrelas” viajar a velocidades maiores que a da luz é inspirada na relatividade espacial e temporal, prevista na Teoria da Relatividade de Einstein. “De uma forma mágica, a Enterprise comprimiria o espaço à sua frente e dilataria o espaço atrás dela, criando uma onda espacial que impulsionaria a nave junto com a luz de tal forma que nesse intervalo do espaço (dentro da onda) a nave não estaria a velocidades maiores que a da luz, ao contrário do que seria percebido por alguém fora dessa onda”. Outro assunto que mexe muito com a imaginação e é apresentado na série de ficção, é o teletransporte, que seria tirar um objeto de uma determinada posição e levá-lo a outra sem passar pelas posições intermediárias. “Atualmente, vários grupos de cientistas têm trabalhado com essapossibilidade”, lembra o professor Las Casas, citando o grupo da Universidadede Innsbruck (Aústria) que, cerca de seis meses atrás, conseguiu fazer com que uma condição física de um fóton (partícula de luz) desvanecesse de um ponto e reaparecesse instantaneamente poucos metros adiante. Curioso é que em “Jornada nas Estrelas”, o teletransporte utilizado para embarque e desembarque de pessoas e cargas nos planetas foi a solução mais barata encontrada para substituir o uso de naves na simulação dessas operações.
Artigo escrito pelo Prof. Renato Las Casas e Divina Mourão (em 01/03/99) da UFMG